domingo, 3 de janeiro de 2010

Maluquices do Português

Ultimamente tenho ouvido vários “falantes” de inglês, afirmarem ser aquele idioma muito mais versátil, prático, económico, entre outras vantagens, do que esta nossa “Língua de Camões”. Contudo, não é sempre assim. Certamente, a maneira sucinta como se conjugam os verbos no idioma anglo-saxão, é um primor de pragmatismo linguístico. Bastaria citar o “to put”, que comporta apenas uma flexão em qualquer que seja o tempo ou a pessoa. Mas, algumas vezes, sucede o oposto quanto a outros aspectos gramaticais. Limitando-me eu a citar somente aquilo que regista a minha memória instantânea, vejamos alguns exemplos: Quando queremos oferecer algo a alguém dizemos simplesmente: “Sirva-se”. É preciso dizer mais? Pois bem, numa certa ocasião vi um "genuíno tuga", fumador inveterado, a pedir um cigarro a um “camóne” e este a responder achando que estaria praticando muito bem o seu “tugalês”: - “Ajude-se a si mesmo”. É que no “patuá” lá dele é assim mesmo que se costuma prestar esta cortesia, ou seja, “help yourself”. O nosso “de nada” ou “nada” com que costumamos responder a um “obrigado” é muito mais complicado em inglês. É certo que a linguagem coloquial intenta facilitar as coisas com a expressão “not at all” que, embora curta, não deixa de encerrar três palavras; todavia o tratamento formal remete a um esquisito “seja bem-vindo” (you’re welcome) quando não complica terrivelmente com um esquisitíssimo “don’t mention it”. Existe algo mais simples do que “onde está” quando se pretende procurar algo? Pois os anglófonos não deixam por menos do que “where is it?” E para quê tanta repetição de pronomes pessoais numa única frase? Nós os lusófonos evitamos usá-los ao máximo possível, como acabei de fazer agora mesmo e, nem por isto, deixei de me expressar com clareza! Esta “escrevinhação” deu-se a propósito de uma conversa que tive com uma amiga e professora de inglês. Eis um breve pensamento. Vejamos como o inglês é uma língua maluca: Não existe nenhum ovo (egg) numa beringela (eggplant); nada de presunto (ham) num hambúrguer, nem tão pouco maçã (apple) num ananás (pineapple). As french fries não foram inventadas em França. Sweetmeats são bombons (e não carnes), enquanto sweetbreads (que não são doces e nem pães), são carnes. Aceitamos a universalização do Inglês como uma concessão. Mas se explorarmos os seus paradoxos, veremos que seu desempenho é fraco. Por exemplo, um ‘guinea pig’ não é da Guiné e nem é um porco. E, se o plural de tooth é teeth por que o de booth não é beeth? O texto podia alongar-se, contudo não vou “massacrar-vos” porque se desvia da minha intenção que é mostrar o lado também “maluco” do nosso próprio vernáculo, quando usado pelos habitantes do designado país irmão, o Brasil. E esta maluqueira verifica-se sobretudo no Nordeste (ou no Northeast como insiste em chamá-lo alguém que sente vergonha ou tem preconceito de citar o seu nome em português), eles dizem: - “Pois não” quando querem dizer “Sim”. E “Pois sim” (quando pronunciado com um certo desdém), que significa “Não”. O “Vou chegando” é muito usado por lá por alguém que “está saindo”. A interjeição “hum, hum”, dependendo de como se pronuncia, pode traduzir tanto negação quanto afirmação. E quanto às flexões do verbo ser! Há casos em que, se não estiverem inseridos num contexto bem claro, tornam-se verdadeiros absurdos surreais. Quando eu digo: “Eu fui”, quero dizer que saí de onde estava e segui para um outro lugar, ou que hoje já não sou aquilo que eu fui outrora? Além demais, os vocábulos raramente estão em sintonia com sua origem etimológica. Assim, um/a “coitado/a” não é aquele ou aquela que sofreu (ou gozou) o coito, mas um desgraçado, um infeliz, um miserável, digno da nossa compaixão. E “enfezado”, que deveria significar “pleno de fezes”; obstipado, na verdade traduz a qualidade de uma pessoa cheia de ira. A sinonímia do nosso vernáculo é tão ampla e diversificada que é preciso muito zelo com as palavras a fim de se evitarem irremediáveis desastres. Como se pode observar neste curto texto, o português não é tão falado, escrito ou disseminado quanto o inglês, mas não lhe fica a dever nada no que toca a “maluquices”. CF/ 2009

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